As identidades afins de Jorge Aragão e Emicida nas rodas do samba e do rap

♫ ANÁLISE ♪ O que Jorge Aragão tem a ver com Emicida? Tudo. Nas rodas de samba, Jorge Aragão sempre expôs orgulho negro, valorizou a ancestralidade do p...

As identidades afins de Jorge Aragão e Emicida nas rodas do samba e do rap
As identidades afins de Jorge Aragão e Emicida nas rodas do samba e do rap (Foto: Reprodução)

♫ ANÁLISE ♪ O que Jorge Aragão tem a ver com Emicida? Tudo. Nas rodas de samba, Jorge Aragão sempre expôs orgulho negro, valorizou a ancestralidade do povo preto e denunciou o preconceito racial. Esse traço ativista da obra do compositor carioca é o ponto de contato mais evidente entre o samba de Aragão e o rap de Emicida, militante positivista das quebradas do hip hop. Daí que faz todo sentido a união dos artistas em Identidade preta, sétimo single do Projeto Identidade, criado por Aragão para enfatizar o caráter engajado do samba do compositor em gravações com nomes do rap como BK, Emicida, Djonga, L7nnon, Rappin' Hood e Xamã. Estranho no ninho do hip hop, Xande de Pilares também integra o elenco preto do Projeto Identidade – cantando a música inédita Papo preto – pela irmandade com Aragão no universo do samba, ainda que sejam de gerações e tribos distintas. Jorge Aragão e Emicida se afinam em Identidade preta porque samba e rap sempre estiveram unidos pela mesma luta contra a opressão da elite branca. São gêneros musicais gerados pela negritude cujo berço é a mãe África. O samba surgiu no Brasil, na ponte Bahia-Rio. O rap veio ao mundo nos Estados Unidos e cruzou oceanos até aportar no Brasil com a mesma consciência de classe. Mas a origem de ambos é a mesma. A batalha cotidiana é a mesma. Jorge Aragão teve essa sacação e, com o Projeto Identidade, enfatiza o caráter político do samba do compositor carioca. Embora visto como o Poeta do samba por embeber o pagode em lirismo, Aragão sempre foi militante nas rodas do samba e da vida. “Quem cede a vez não quer vitória / Somos herança da memória / Temos a cor da noite / Filhos de todo açoite / Fato real de nossa história / Se preto de alma branca pra você / É o exemplo da dignidade / Não nos ajuda, só nos faz sofrer / Nem resgata nossa identidade”, ensinou o poeta há 32 anos na letra do samba que batiza o projeto, Identidade (Jorge Aragão, 1992), ora reapresentado como Identidade preta na releitura com Emicida, feita com novos versos e sonoridade. Em rotação desde sexta-feira, com produção musical e beat de Keviin, o single Identidade preta reforça as afinidades de Jorge Aragão e Emicida nas quebradas do samba e do rap. Os singles anteriores seguiram na mesma linha. Com o rapper L7nnon, Aragão remodelou Cabelo pixaim (Jorge Aragão e Jotabê, 1977), samba rebatizado Cotidiano pixaim. Djonga deu voz a Moleque atrevido (Jorge Aragão, Flávio Cardoso e Paulinho Resende, 1998), samba que passou a se chamar Respeita na releitura com Aragão. Rappin' Hood refez Dobradinha light (Jorge Aragão, 2003) com o nome de Mafuá. BK deu o tom de Preto, cor preta (Jorge Aragão, 1999), samba renomeado Inter'Preta cor. Já Xamã rebobinou Tape deck (Jorge Aragão, 1999), samba rebatizado Take deck digital (Uns manos). Os títulos das músicas originais de Aragão sofreram alterações porque os rappers criaram versos inéditos para as letras dos sambas em sintonia com o espírito engajado da obra de Jorge Aragão, bamba de aguçada consciência negra e de identidade firme. Jorge Aragão (à esquerda) e Emicida lançam o single ‘Identidade preta’, parte do ‘Projeto identidade’, de Aragão Divulgação